Os Melhores do ano 2022

Mind the Glass

O ano de 2022 ficou marcado por inúmeros acontecimentos nacionais, mas o mais importante talvez tenha sido o regresso da normalidade à vida dos portugueses. Agora que os dias do “novo normal” foram trocados pelo “velho normal” regressaram os eventos vínicos e as vendas dos vinhos nacionais aumentaram. No entanto, nem tudo regressou à normalidade.

Num artigo recentemente publicado no site Wine & Stuff foram destacados vários acontecimentos mundiais ao longo do ano que agora finda. Quase todos eles estão correlacionados com duas temáticas absolutamente incontornáveis: as alterações climáticas e a guerra na Ucrânia.

Em boa verdade, a primeira temática tem sido recorrente, mas a segunda é recente e surgiu quase de rompante estendendo-se profundamente ao universo vínico nacional. Muitos embora os constrangimentos sejam muitos, os produtores lançam no mercado o que de melhor têm guardado nas suas caves.

Os dez vinhos (provados ao longo do ano), o enólogo e o projeto vínico que apresento em seguida revelam o que de melhor se fez no panorama vínico nacional.

Os Melhores do Ano

Espumantes

Joana Vasconcelos by Quanta Terra Espumante Bruto 2018

Este espumante mostra-se quase etéreo e contido tal é a elegância revelada. Imperdível. Um vinho com elevada nota artística. Eu tomaria banho nele!

Quinta das Bágeiras Pai Abel Grande Reserva Bruto Natural Espumante 2016

A opção pela fermentação em barrica e pelos 4 anos de estágio emprestaram uma complexidade suplementar a este grande espumante da Bairrada. A não perder.

BRANCO COM BARRICA

António Maçanita Vinha dos Utras Criação Velha 1os Jeirões Branco 2020

Talvez seja uma das melhores referências nacionais no que toca a vinhos brancos. Um vinho invulgar e avassalador que coloca o nosso país sob o foco mundial das atenções.

BRANCO SEM BARRICA

XXVI Talhas XXVI Branco 2020

De cor amarela. Esta referência apresenta, em primeira linha, aromas resinosos, banana, cera, terra molhada, frutos secos e azeite. Estes são ainda complementados por aromas ténues a flores, fruta de caroço e leve favo de mel. No palato mostra banana e fruto secos muito bem articulados com a textura, conferida pelos taninos e acidez.

Este talvez seja um dos melhores vinhos de talha que já provei.

ROSÉS

Rosa Celeste by Quinta da Gaivosa Rosé 2020

Um vinho aromaticamente complexo no qual se destacam os aromas flores, fruta vermelha, leves especiarias e alguma mineralidade. No palato revela fruta vermelha fresca, devido à acidez bem marcada, recortada por leves especiarias. Um belíssimo exemplar.

TINTO COM BARRICA

Textura Vinha Negrosa Tinto 2019

Uma referência absolutamente excecional. Um vinho muito elegante e ainda com muitos anos pela frente. A não perder.

TINTO SEM BARRICA

Primado SB Tinto 2021

Esta nova referência revela pura elegância e virtuosismo. Um caso sério de amor ao primeiro trago. Um novo vinho de culto para quem não aprecia barrica.

TINTO COM IDADE

Colares Chitas Tinto 2005

Puro luxo, classe e caráter. Denso e estruturado sem nunca perder uma elegância sublime. Um vinho ainda cheio de vida.

FORTIFICADOS

Kopke Porto Branco 50 Anos

Os laivos esverdeados marcam a cor deste vinho. Os aromas e sabores remetem para os frutos secos, madeira exótica, melaço e…. leve fruta de caroço.

Um Porto inebriante que oferece uma paleta de aromas complexos que vão mudando com a temperatura de prova.

Adega de Favaios Edição Comemorativa 70 Anos

Este vinho mostra aromas a funcho, casca de laranja, farmácia, alguma fruta de caroço, caramelo e vinagrinho. O palato mostra fruta de caroço, figo, mel e melaço num registo muito fresco. Um dos melhores moscateis do Douro que já provei.

ACONTECIMENTO VÍNICO DO ANO

100 Anos da Bacalhôa

Credits: Bacalhôa Vinhos de Portugal

Quando se atinge a idade de 100 Anos é uma ocasião para comemorar, mas quando uma empresa do setor vínico chega ao seu centenário a ocasião é para mostrar um grande orgulho. Maior será o motivo se essa instituição mostrou capacidade de inovação e é objeto de reconhecimento e prestígio pelos consumidores. Foi isso mesmo que a Bacalhôa Vinhos de Portugal conseguiu.

A empresa nasceu em 1922 com a denominação João Pires & Filhos com o intuito de vender vinho a granel. Com o passar dos anos, a natural vontade de inovação acentuou-se e em 1981 a empresa lançou no mercado o primeiro vinho branco com estágio em barricas novas, o Catarina.

Aproveitando o sucesso alcançado, cinco anos depois, em 1985, lançou o vinho Cova da Ursa, que foi o primeiro Chardonnay Português a fermentar em barricas de madeira.

A década de 80 também ficou na história vínica nacional. A empresa contratou Peter Bright um australiano que apontou novos caminhos que ajudaram a moldar a moderna enologia portuguesa. Foi uma época de ouro.

Com a compra, em 1998, da empresa pelo comendador José Berardo iniciou-se um período de aquisições de novas propriedades e vinhas. No ano de 2005, a empresa alterou o nome inicial para o que detém nos dias de hoje e em 2014 foi eleita como empresa do ano.

Atualmente, a empresa contabiliza um total de 1200ha de vinhas distribuídas pelo Alentejo, Península de Setúbal, Bairrada, Beiras, Dão e Douro. Parabéns, que venham mais 100.

PROJETO VÍNICO DO ANO

Natus Vini

Em 2008, Hamilton Reis adquiriu uma pequena propriedade no sopé da Serra do Mendro, em pleno coração da Vidigueira.
No entanto, os trabalhos no terreno não se iniciaram na mesma altura. Decorreram dez anos de estudo nos quais a terra serviu de local de pastoreio extensivo a cavalos garantindo, desta forma, um pousio potenciador de um “terroir” genuíno, apto a criar uma ideia, uma vinha, um vinho e uma família.

As obras na adega e na casa familiar arrancaram em 2017 e a plantação manual da vinha realizou-se em 2018. Nascia assim, a Natus Vini focada na produção de vinhos de caráter traduzindo o clima, o solo e castas locais.

A adega, simples, de garagem, conta com seculares talhas não revestidas de puro barro alentejano, pipas de castanho e carvalho português muito velhas.

A visão de Hamilton Reis, alicerçada em 14 anos de experiência, almeja um regresso ao passado de um Alentejo de tintos de cor aberta, com maior frescura e elegância, e vinhos brancos com untuosidade, densos e ricos.

Um projeto cheio de potencial e experiência que vale bem a pena conhecer.

ENÓLOGO DO ANO

Hamilton Reis

Muitos de nós temos uma imagem construída em torno do Hamilton Reis como um alentejano de gema, onde passou a vida a produzir vinhos. Nada mais enganador, em boa verdade nasceu e estudou na cidade do Porto até ingressar na Escola Superior Agrária de Beja para cursar engenharia agrária. Como complemento licenciou-se em microbiologia e, mais tarde, pós-graduou-se em viticultura e enologia na Universidade Católica.

Profissionalmente iniciou-se na Herdade dos Grous, intercalando viagens de trabalho à Austrália e Nova Zelândia, nas quais conseguiu alargar ainda mais os horizontes de aprendizagem.

Com a entrada na Cortes de Cima, primeiro como assistente, e depois como diretor de enologia, começou a cartografar um percurso invulgar na região do Alentejo e em Portugal. Como responsável por toda a enologia da empresa foi o capitão que fundeou a âncora do velho veleiro da família Jorgensen no imenso mar vínico português.

Ao fim de 14 anos de trabalho, e através da bússola enológica de Hamilton Reis, a Cortes de Cima chegou a um porto no qual desfraldou uma bandeira ondulante de autenticidade e revelou um porão recheado com referências vínicas que denotam inovação.

O trabalho que desenvolveu na empresa em torno do estudo e aprimoramento da casta Syrah ainda não mereceram o devido reconhecimento nacional, mas o trabalho realizado facilmente lhe conferiria o epíteto “Sr. Syrah”.

Nos últimos dois anos e meio assumiu os comandos vínicos de uma das empresas mais reputadas e tradicionais do Alentejo, a Herdade do Mouchão. O curto espaço de tempo decorrido nas novas funções ainda não foi o suficiente para mostrar o trabalho desenvolvido, mas também aqui as marés futuras correm de feição.

Ao longo destes anos revelou-se um brilhante enólogo que tem passado por entre os pingos da chuva de prémios da enologia atribuídos pelas publicações nacionais de formato tradicional. Aqui fica o reconhecimento.

Muitos parabéns, Hamilton Reis.

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